O movimento de protesto atingiu níveis que certamente não
eram imaginados pelos seus organizadores, tendo incrível visibilidade social.
Com exceção da violência e da depredação ao patrimônio
público em casos isolados, tem repercutido positivamente a voz das ruas e das
redes sociais contra o aumento do preço das passagens dos transportes públicos,
o superfaturamento nas obras da Copa do Mundo (2014) e das Olimpíadas (2016), a
corrupção endêmica que assola todos os grotões do país, a falta de sistemas de
saúde, educação e segurança dignos, o monopólio policial em relação às
investigações criminais preliminares (PEC 37).
Viu-se – e está-se vendo – que o povo brasileiro superou sua
secular passividade, transmitindo a mensagem de claro descontentamento em
relação às atitudes tomadas pelos nossos representantes eleitos através do
voto.
Começa-se a entender que o povo unido é muito mais forte e
pode superar inúmeras situações de desconforto.
Isso acabou se confirmando com as declarações dos
governadores e prefeitos de São Paulo, Rio de Janeiro e de diversas outras localidades
a respeito da manutenção do preço das passagens dos transportes públicos que,
sem dúvida, foi uma importante vitória.
No entanto, tem-se uma forte preocupação: o que vai ser feito
agora?
Vai todo mundo pra casa feliz por ter não se concretizado o
referido aumento ou o movimento vai permanecer exigindo tomadas de decisões que
venham a impactar nas outras áreas?
O cientista social Giovanni Alves, no artigo Ocupar Wall Street...
e depois?, lança mãos de algumas indagações que podem ser perfeitamente
dirigidas ao movimento ora verificado no Brasil. São elas:
“(1) Terão os movimentos sociais de indignados capacidade de
elaborar em si e para si uma plataforma política mínima capaz de exercitar a
hegemonia social e cultural, preparando-se para uma longa ‘guerra de posição’ e
acumulando forças sociais e políticas sob o cenário da barbárie social e do
capitalismo manipulatório?
(2) Terão eles condições de criar condições efetivas
(político-ideológicas) para o surgimento de novas organizações de classe,
capazes de traduzir, no plano da institucionalidade democrática, as medidas
necessárias para a realização dos anseios dos indignados, sob pena de
frustração irremediável? (É importante lembrar, como nos alerta Boaventura de
Souza Santos, que o colapso de expectativas é o esteio do fascismo social).
(3) Até que ponto movimentos sociais como o Ocuppy Wall
Street e o dos Indignados europeus [toma-se a liberdade para incluir aqui o
Movimento do Passe Livre] terão a densidade histórica necessária para derrubar
ou pautar governos, refundar ou enterrar partidos, fortalecer ou descartar
lideranças?
(4) Finalmente, até que ponto seriam eles efetivamente
capazes de fazer história numa perspectiva para além do capitalismo que, em si
e para si, é incapaz de incorporar as demandas sociais do precariado, tendo em vista
a nova fase do capitalismo histórico imerso ou contradições sociais intensas?”.[1]
À vista disso, cabe, pois, aguardar quais serão os próximos passos, com a expectativa de que tais respostas venham a ser respondidas.
[1] ALVES, Giovanni. Ocupar Wall Street... e depois? In: Ocuppy: movimentos de protesto que tomaram as ruas. São Paulo: Boitempo, 2012, págs. 37-38.